“Na primeira noite, eles se aproximam e colhem uma flor do nosso jardim. E não dizemos nada. Na segunda noite, já não se escondem, pisam as flores e matam o nosso cão. E não dizemos nada. Até que um dia, o mais frágil deles, entra sozinho em nossa casa, rouba-nos a luz, e, conhecendo nosso medo, arranca-nos a voz da garganta. E porque nunca dissemos nada, já não poderemos dizer mais nada”. Esse texto reflexivo é creditado ao poeta russo Maiakovski em alguns locais da internet, mas em outros, os créditos vão para Eduardo Alves da Costa. Seja quem for o autor, não diminui a eloquência dele.
De todas as partes do mundo nos chegam noticias aterradoras. Guerras desnecessárias, assaltos, incestos, pedofilia, crimes bárbaros. Mata-se por nada. A vida vale menos do que um celular, um par de tênis ou uma carteira com cheques e cartões.
Alunos agridem professores, não só verbalmente, mas chegam a lesioná-los fisicamente. Filhos matam pais e pais assassinam os próprios filhos. Amante revoltada estrangula a filha do namorado por não controlar o ciúme. Mãe joga filha recém nascida no lixo alegando que não podia cuidar dela porque ganhava pouco.
A humanidade está gravemente enferma e não existe um remédio eficiente para combater o mal que a acomete.
Os prognósticos não são nada bons. Como trazer à luz tantas pessoas envoltas nas trevas? Existe um remédio, uma poção mágica, uma varinha de condão que transforme a aura do planeta?
Violam-se regras, atropelam-se princípios éticos, morais, espirituais e jurídicos. O exemplo vem até de quem deveria zelar por esses valores. E o povo acata sem se rebelar. Como bois rumo ao matadouro, seguimos calados, entorpecidos, sem ação.
Se a coisa anda ruim entre os humanos, imaginem com os animais, criaturas que não podem se defender, à mercê da raça humana.
Uma cadela idosa foi assassinada a vassouradas dentro do portão da residência dos donos. Um cão pit bull foi amarrado com tiras de borracha e jogado num córrego para morrer aos poucos. A farra do boi continua na semana santa, as brigas de galo, rodeios, e outras contravenções são realizadas à revelia das leis que as proíbem.
Sinto que as pessoas perderam a capacidade de se indignar. Engolem todo o bolo indigesto e acabam aceitando a violência sem reagir. Criam uma couraça de indiferença para não sofrer. O coração endurece. Não é comigo, então, vamos prosseguir a vida. Não foi meu filho, não foi meu cão, a guerra não é no meu país.
E assim, a violência se agiganta, adubada pela nossa apatia e pela impunidade.
Perdemos a capacidade de reagir? Extinguiu-se a nossa faculdade de ficar indignados? Desaprendemos como clamar por justiça e como cobrar das autoridades a aplicação das leis que existem “para inglês ver”? Não possuímos mais o dom da compaixão? Afinal, somos gente ou robôs?
Manter-se neutro ajuda o opressor e não a vítima. E nem sempre o silêncio é de ouro, às vezes é preciso falar, gritar, vociferar, protestar em altos brados, engrossar o coro com outras vozes indignadas e fazer com que ecoem pelo mundo e cheguem aos ouvidos de quem pode mudar o rumo das coisas.
Dizem que se peca por pensamentos, palavras e obras, mas acrescento: peca-se por omissão também. Urge que se concretizem ações!
Texto Ivana Maria França de Negri é escritora